sábado, 19 de março de 2011

"Carta ao Pai" Kafka (excerto)

“Tu perguntaste-me recentemente porque afirmo
ter medo de ti. Eu não soube, como de costume, o
que te responder, em parte justamente pelo medo que
tenho de ti, em parte porque existem tantos detalhes
na justificativa desse medo, que eu não poderia reuni-
los no ato de falar de modo mais ou menos coerente.
E se procuro responder-te aqui por escrito, não
deixará de ser de modo incompleto, porque também no ato de escrever o medo e suas conseqüências me
atrapalham diante de ti e porque a grandeza do tema
ultrapassa de longe minha memória e meu entendimento..."


não sei se te devo ligar…e estou a tentar fazer de conta que me esqueci..se passar das 10 quando me lembrar já não te ligo.depois dessa hora já deves estar a dormir, porque deitas-te sempre tão cedo.quando era mais pequenina não gostava desse teu hábito, porque depois querias que eu fosse dormir também porque não podia ficar sozinha a ver televisão, mas quando já pude ficar acordada até às horas que me apetecesse, acabava por ser apaziguador.sabia que já estavas a descansar, e so ficava à espera de não ouvir mais a tua voz baixinho…so queria que adormecesses rápido…
quando me pedem para falar sobre ti, fico calada.não que não tenha as palavras para ti,(as que sinto mais até são tuas , apesar de desejar que fossem outras) mas é sem som que prefiro vê-las… o teu nome dito em voz alta é estranho, com letras e sons que parecem nunca ter sido inventados …tal como a tua presença em mim:estives-te sempre la, mas parece que nunca estives-te de verdade…
eles não te percebem, o que eu percebo muito bem, porque a minha compreensão para contigo e as tentativas de te desculpar acabam por me fazer chatear comigo própria…mas eu vejo que és tão poucas vezes feliz e procuro infinitamente motivos para não quereres sair daí, mas também não tens o direito de querer implantar as tuas dores em nós…deves ter muitas portas abertas e deve estar frio e chover aí dentro muitas vezes, mas nunca deixas que te ajudem a fechá-las…às vezes fico a pensar que também é culpa da minha fraqueza, porque não o tento muitas vezes, mas já esta-mos tão longe um do outro, que agora ir até ti exige uma força que não tenho… será que percebes que quero saber de ti quando te ligo so para falar de questões práticas e necessárias? Nunca falá-mos os dois para além do prático e do necessário… é como se te faltasse uma face…será que pensas o mesmo de mim?...porque é que nunca nos pergunta-mos se esta-mos bem e so me perguntas o que preciso…tantas vezes o que precisava era so mesmo a tua pergunta(“esta tudo bem contigo?”)…mas eu... que também não o faço...
há muito que me lembro de pensar que um dia vai ser diferente, que me vais voltar a tocar,…que vou conseguir dar-te um beijinho de despedida quando me vais levar…e dar importância à data(o meu alheamento com as datas é herança tua, porque quase todas têm marcas que quero apagar) …e ligar-te com o carinho que acho que nunca tives-te e talvez por isso nunca me ensinas-te a dar…talvez um dia...*

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